Cicatrizes
Quando vejo uma cicatriz,
seja em mim ou nos meus filhos, sempre me lembro do momento em que ela
apareceu. Onde eu estava, o que aconteceu, o que eu fiz, se eu chorei, o quanto
doeu, e o quanto foi difícil segurar o choro e a dor. Lembro que possivelmente
foi ainda mais doído quando tentei lavar o sangue, limpar qualquer sujeira que
iria infeccioná-la, o remédio que tive que colocar para ajudar a curá-la, o
quanto ardeu, e talvez a dúvida em deixar o machucado latejando, ou colocar
algo que aumentaria a dor, mas ajudaria a curar mais rápido.
Depois, me lembro da
ansiedade em saber se iria cicatrizar logo, e se depois de curada haveria uma
marca para lembrar para sempre daquele momento. Será que vai virar uma
quelóide? Que vai ficar escura? Será que as pessoas vão ver? Será que vão
imaginar algo pior do que foi? Será que iam me achar mais feia ou então
descuidada? Ou pior: será que vão me ferir de novo ali e abrir de novo a minha
cicatriz?
Assim como as
cicatrizes, as feridas da nossa alma e as marcas do nosso subconsciente falam
conosco diariamente. Será que podemos usar métodos psiquiátricos para imunizar
um pensamento ou possibilidades espirituais para abafar um trauma? Com qual
borracha podemos apagar uma dor que virou ferida, que da ferida se transformou
em cicatriz e da cicatriz surgiu uma marca?
Minhas cicatrizes são
memórias usadas por mim todos os dias. Como um relógio despertador, me lembram,
no momento certo, que eu já passei por dores, por momentos que pareciam
intermináveis, por uma ferida exposta, aberta, infeccionada, e mesmo quando
esbarram e a abrem de novo, mais uma vez elas fecham, cicatrizam, e passam!
Assim como feridas na
pele podem cicatrizar, mas deixar marcas, dores nos relacionamentos podem ser
perdoados e cicatrizados, mas podem nunca ser apagados. Se encararmos com uma
memória daquilo que nos traz esperança, saberemos que é possível enfrentar a
dor, curá-la, e que poderemos enfrentá-la de novo muitas outras vezes. A força
vem da promessa de que o que passamos nunca é maior daquilo que podemos
suportar. Afinal, todos já vimos um corpo passar por grandes dores e continuar
caminhando; um coração enfrentar paradas cardíacas e voltar a bater com
coragem; pessoas “morrerem” em hospitais e voltarem depois de horas. Isso é o
ser humano, é o poder de ressurreição, de renovo, de reconquista, passando por
cima de toda e qualquer circunstância para provar que, apesar dos sinais de
cortes abertos que expressam toda lembrança, podemos ter a certeza de que há
sim, esperança!
Carol Celico
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